A Holistic Mission Guide

The Church’s Response in Times of Crisis

Ser Igreja fora do templo

Neste breve ensaio queremos apresentar a experiência da Igreja Batista de Água Branca (Ibab), na capital de São Paulo, Brasil, que, durante a pandemia, adotou o lema: “ser igreja fora do templo”. A Ibab possui uma congregação que ultrapassa 5.000 membros arrolados, mas é impossível mensurar o alcance global das ações desta comunidade. Seu canal no YouTube possui cerca de 210 mil assinantes e registra mais de 25 mil acessos para acompanhamento das celebrações transmitidas aos domingos. 

Desde o início dos anos 1990, quando a liderança redirecionou sua ênfase para o evangelho puro e simples dos discípulos de Jesus Cristo, a comunidade passou a dedicar-se mais à Missão e à organicidade do Corpo de Cristo, enquanto progressivamente se desapegava do institucionalismo religioso. Com isso, tornou-se uma referência e tem abençoado centenas de milhares de pessoas em todo o globo.

A equipe ministerial, liderada pelo pastor Ed René Kivitz, é composta pelos pastores e pastoras: Eduardo Fetterman (Adolescentes), Filipe dos Anjos (Adulto e Cidade), Claudio Manhães (Pastoral), André Saldiba (Famílias e Juventude), Robinson Jacintho (Pequenos Grupos e Educação), Paulo César Baruk (Celebração), Sílvia Kivitz (Missão e Rede Ibab Solidária) e Fernanda Kivitz (Crianças). Diferentes vozes nesta equipe contribuíram neste relato.

Quando a pandemia começou, a Ibab foi uma das primeiras comunidades a anunciar publicamente a suspensão de seus cultos presenciais, enquanto muitas lideranças, incrédulas sobre o potencial devastador da pandemia, demoraram tempo demais para tomar a mesma decisão. Para a liderança da Ibab, o fator decisivo era proteger a vida das pessoas, considerando o alto potencial de contaminação na interação entre as crianças (transmissoras inevitáveis) e os idosos (grupo de risco), avós destas mesmas crianças. A congregação de crianças que se reunia dominicalmente na Ibab passava de mil integrantes.

A Ibab já era uma comunidade muito representativa nas redes sociais. A pandemia acentuou esta representatividade, mas a adoração comunitária foi sensivelmente transformada. Eduardo Fetterman, que também atua na equipe de adoração, disse que a Ibab investiu em mais equipamentos para que as transmissões tivessem a maior qualidade possível e ressaltou o sofrimento que muitas comunidades experimentam justamente por não possuírem tais recursos para investir numa estrutura semelhante em tempos de distanciamento social. A adoração teve sua equipe presencial reduzida, gravando os cânticos previamente enquanto a pregação é transmitida em tempo real. 

Nos pequenos grupos a dinâmica foi de fortalecimento da comunhão, ainda que virtualmente. A maioria dos voluntários nos diversos ministérios continua sem oportunidade de serviço presencial. Embora os encontros virtuais estejam preservando as conexões, como os adolescentes são muito relacionais, às vezes desanimam pela falta de convivência com sua turma. Por isso os encontros semanais foram adaptados para rodas de conversa possibilitando maior interação.

Ainda na dinâmica da adoração comunitária, Fernanda Kivitz reporta que “a pandemia nos colocou diante do desafio de viver, de fato, a experiência de ser igreja para além de frequentar a igreja/instituição”.  No ministério infantil focamos na “possibilidade de ser igreja em família”.  Enquanto as famílias iam à igreja, cada pessoa vivia uma experiência singular que não era, necessariamente, compartilhada com os demais. Compreendendo que os pais são os principais mediadores das experiências espirituais das crianças, a vivência de ser igreja em família foi estimulada. Um ponto positivo foi este “resgate da experiência familiar ao redor da Bíblia, propondo conversas significativas em casa”. 

A Ibab é reconhecida como uma igreja muito comprometida com a Missão e com sua inserção social. A igreja apoia 52 organizações e projetos sócio-missionários de cuidado humano por meio da Rede Ibab Solidária. Neste ano pandêmico a liderança apelou à generosidade da comunidade, pois neste momento de crise o sofrimento humano e as necessidades aumentaram, além das incertezas no cenário econômico. Durante a pandemia, a comunidade não apenas amadureceu, como mobilizou-se ainda mais em ações de misericórdia, compaixão e justiça, respondendo à crise global de maneira positiva e inspiradora. 

A maior prova desta resposta aconteceu em dezembro de 2020, quando a comunidade vivenciou algo inédito na sua história de generosidade. As campanhas de natal, que acontecem há 19 anos sempre foram muito desafiadoras. O alvo de 2020 era maior que os anteriores. A comunidade ultrapassou em 120% a meta estabelecida marcando a vida de cada membro de modo singular. 

A atenção da comunidade também se dirige às necessidades de seus membros. Além da assistência social prestada às famílias mais carentes, a Rede Ibab Solidária promoveu mentoria e seminários para os pequenos empreendedores. Grandes empreendedores consolidados no mundo corporativo vieram auxiliar os pequenos empreendedores que precisaram reinventar suas atividades profissionais devido ao colapso na economia e no mundo do trabalho.  O olhar de equidade sobre as necessidades humanas dentro e fora da comunidade é parte da identidade da Ibab.

Na visão de Eduardo Fetterman, a comunidade se fez mais presente no Brasil como um todo, não apenas oferecendo conteúdos de qualidade, como alcançando mais pessoas com o evangelho. Em parcerias com organizações como a UNICEF e a Visão Mundial, liderou ações de misericórdia em muitos níveis, inclusive comprando e enviando 1000 cilindros de oxigênio para Manaus, socorrendo a cidade na maior crise da segunda onda do COVID-19, em Janeiro de 2021. Algumas ações de misericórdia foram interrompidas, como o apoio educacional presencial que os adolescentes prestavam às pessoas com limitações cognitivas e aos imigrantes bolivianos, mas outras oportunidades surgiram.

Fernanda Kivitz acrescenta: “vejo uma comunidade pronta para servir, para doar e se doar, pronta para o trabalho. Temos sede de gente, de encontro, de conexão, e pessoas precisam de pessoas. A pandemia e o distanciamento social escancararam as desigualdades que vivemos e isso gera dor, angústia e revolta, mas as pessoas estão com vontade de fazer algo relevante, útil e transformador”. Uma das mudanças mais significativas no evangelismo e discipulado foi a consciência de que que a igreja é parceira das famílias no discipulado das crianças, mas que os pais e cuidadores das crianças compõem o núcleo central das experiências espirituais dos pequeninos. Com isso, as crianças passaram a ter experiências com Jesus na vivência de suas famílias e não mais sob a tutoria dos professores do ministério infantil. A igreja não é responsável pela jornada espiritual de uma criança, mas sim uma facilitadora deste processo junto à família. 

Outros ministérios também ligados ao discipulado fizeram sensíveis adaptações na sua atuação. No ministério pastoral, sob a liderança do pastor Claudio Manhães, houve a criação de uma capelania para apoio psicológico durante a quarentena.  Uma equipe de psicólogos e psicólogas da igreja passou a ofertar seu tempo para atendimentos virtuais voluntários às pessoas necessitadas deste tipo de suporte, atendendo também aos profissionais da saúde que, estando no front do combate ao COVID-19, se encontravam em burnout. Também atrelado ao ministério pastoral, a Ibab sedia a coordenação do Celebrando a Recuperação no Brasil. O programa, essencialmente presencial, adaptou-se ao funcionamento virtual nos encontros pequenos e grandes grupos. 

“#tododiameiodia” tornou-se o ponto de encontro da comunidade para a oração, preservando sua identidade, suas tradições e sua fé nos caminhos da sua dispersão à semelhança dos hebreus e dos primeiros cristãos, iniciativa liderada pelo pastor André Saldiba.

Antes mesmo da pandemia o ministério Ibab Educação já se estruturava para oferecer uma educação cristã de alta qualidade em plataformas de Ensino a Distância, alcançando, principalmente, a multidão de pessoas que se sentem participantes da Ibab, mas estão geograficamente distantes. A pandemia acelerou este processo e atualmente o ministério oferta uma rede de cursos de curta duração para o período de férias e o curso mais extenso sobre Espiritualidade Cristã.

A Ibab é uma das raras igrejas no Brasil que há vários anos dedica-se à discussões raciais e de gênero. Contrastando com o quadro de aumento da violência doméstica durante a pandemia, o Ministério dos Homens promoveu simpósios e estudos nos pequenos grupos de combate à violência de gênero. Particularmente atuei como conferencista no capítulo sobre Jesus e a Masculinidade Não-Violenta, sendo este apenas um das várias iniciativas.

O Fórum de Consciência Negra da Ibab é uma iniciativa permanente criada a partir da necessidade de dialogar sobre o racismo estrutural e sistêmico bem como combate-lo. Durante a pandemia este fórum intensificou suas ações concretas na busca de equidade, acolhimento, reconciliação, resgate da dignidade e promoção da justiça, especialmente após o assassinato de George Floyd.

Muitas comunidades experimentaram uma grande desconexão entre seus membros durante a pandemia. Testemunhamos vários líderes amedrontados com a dispersão dos membros e com o colapso financeiro. “Ser Igreja fora do templo” nos apresentou mais profundamente este Deus que é dono de todos os recursos. Do meio do deserto, floresceu a criatividade e os recursos surgiram quando as necessidades humanas foram priorizadas. Mesmo quando a liderança orientava: “cuide financeiramente primeiro dos seus familiares” os membros continuavam contribuindo financeiramente. Quem podia, contribuía mais para auxiliar os que necessitavam. Na data mais importante da vida da comunidade a generosidade sobrepujou de modo exuberante.

Nas palavras do pastor sênior, Ed René Kivitz, “a experiência da Ibab na pandemia tem sido a de aprofundar e estender a práxis de sua visão, missão e filosofia de ministério. Em sua Visão a Ibab declara que deseja “ser um sinal histórico do reino de Deus”, protagonizando em sua vivência comunitária os mesmos frutos do ministério de Jesus: libertação, salvação, reconciliação, restauração da pessoa humana em todas as suas relações. Inspirada no movimento de Lausanne e da Teologia da Missão Integral, sua declaração de Missão diz que é uma igreja comprometida a “levar o evangelho todo para o homem todo”, e atua orientada por sua filosofia de ministério definida como “priorizar relacionamentos, envolvendo todos os seus frequentadores além dos limites culto-clero-domingo-templo”, isto é, uma igreja que acontece privilegiadamente numa grande rede de relacionamentos, diaconia e testemunho integral do Evangelho. Os tempos pandêmicos não provocaram muitas mudanças na dinâmica cotidiana da Ibab, mas exigiram um compromisso de fidelidade ainda mais sacrificial com tudo quanto tem vivido em sua história recente, à luz do discernimento que tem recebido do Evangelho, especialmente conforme a reflexão teológica própria da América Latina”.

Que este exemplo nos inspire a observarmos o crescimento das oportunidades de serviço que a pandemia nos trouxe, elas cresceram na proporção que cresceram as necessidades humanas. Que a pandemia ensine a toda a família batista ao redor do mundo que é tempo de servir com criatividade.

Igreja Batista de Água Branca na web:

https://Ibab.com.br

https://www.youtube.com/user/oficialIbab

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About the Author

Lília Dias Marianno is a researcher, professor, and theologian with a PhD in Epistemology (UFRJ) and a MSc in Biblical Exegesis (UMESP). She has worked in various sectors of the Brazilian Baptist Convention, including the coordination of Christian Education. She is a Fellow Researcher at the Center for Process Studies (CPS) and a member of the board of directors for the Brazilian Association of Biblical Research (ABIB).
Lília Dias Marianno

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